quinta-feira, 8 de julho de 2010

Crítica do Filme: Os Homens que Encaravam Cabras

Tragicomédia com George Clooney almeja atingir o nível kubrickiano de ridicularização da guerra




Uma controversa pesquisa de 1947, do general do exército dos EUA e historiador S.L.A. Marshall, levantou que 85% dos homens de infantaria do país não dispararam armas em combate, mesmo sob risco de morrer. Para Marshall, o contato corpo a corpo - quando é possível identificar o ser humano nas linhas inimigas - geraria uma aversão à obrigação de matar.

Uma das cenas mais engraçadas de Os Homens que Encaravam Cabras (The Men Who Stare at Goats) envolve Jeff Bridges numa posição dessas, sendo alvejado no Vietnã porque seu pelotão simplesmente atirava alto demais, por instinto, para não acertar um mísero vietcongue. É uma cena naturalmente cômica que surge de uma situação essencialmente trágica.

É com a tragicomédia da condição humana, afinal, que trabalha o diretor Grant Heslov, sócio do protagonista George Clooney na produtora Smoke House. Nascem do absurdo de situações reais as oportunidades de humor. Como bem avisam os créditos iniciais, "você ficaria surpreso com a quantidade de coisas neste filme que são verídicas".

Uma delas é achar - veja só - que os Estados Unidos têm a vocação moral, quase transcendental, quase divina, de salvar o mundo. O personagem de Bridges, Bill Django (inspirado na história de vida do tenente-coronel Jim Channon), volta do Vietnã crente de que seja possível fazer a paz não com tiros, mas com amor. De sua utopia hippie nasce o Exército da Nova Terra, divisão do exército dos EUA que emprega poderes psíquicos em combate. São homens de bigodes bem aparados que, dizem, podem até matar uma cabra com o olhar.

O longa intercala os flashbacks dos anos 80, do treinamento de Django e seus homens, com a trama ambientada no Iraque dos dias de hoje, quando o melhor homem do agora extinto Exército da Nova Terra, Lyn Cassady (Clooney), se perde no deserto iraquiano ao lado de um jornalista covarde, Bob Wilton (Ewan McGregor). A ideia de Heslov e Clooney não é, então, satirizar exatamente o histórico messiânico das guerras que o país trava, mas expor o ridículo daquilo que os EUA armaram para si especificamente no Oriente Médio.

E aí as gags funcionam melhor ou pior dependendo do que Heslov entende como prioridade: se a ideia é partir da mensagem (tortura de presos é mau, por exemplo), o humor possível fica prisioneiro dela, deixa um gosto meio amargo na boca. Se a ideia, ao inverso, é partir do humor como um fim em si mesmo para eventualmente extrair uma mensagem, o filme se amplia além do mero engajamento.

Não por acaso as melhores cenas estão nos flashbacks, rindo não só de um episódio específico da jornada belicista dos EUA mas de toda a construção do mito de seu poderio. O que impede Os Homens que Encaravam Cabras de alcançar um nível kubrickiano de graça - não são poucas as gags que dialogam com Dr. Fantástico - é que em Kubrick o alvo do escracho é a guerra enquanto conceito. O alvo de Heslov e Clooney é a Guerra do Iraque.



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